Que dias são esses? Foram sempre assim os dias? A aspereza
dos olhares me cutuca a alma tão forte que faz sangrar. Na fila do ônibus, se
empurra, quem sabe para chegar logo em casa e fugir da dor da rua: que é a dor
do mundo, com suas feridas expostas de pedidos de ajuda, de vendas de balas e
de crianças jogadas nos bancos dos terminais, e vejam que nossos olhos nem são
capazes de captar todo o absurdo produzido por um sistema que cria os pobres
para sustentar nas próprias costas os ricos que são poucos, mas pesam muito. Empurram
nas filas pela disputa mixuruca de uma cadeira que salve do aperto e da dor nas
pernas que castiga a cada um de forma particular no fim de mais esse dia de
trabalho, no fim de mais essa semana, no fim de mais essa esperança de que algo
cure essa maldita dor e essa necessidade cotidiana de sobreviver.
A solidão sim é democrática, acompanha a todos.
Sentada ao meu lado do ônibus, chora uma mulher, choro eu
também por dentro fingindo não chorar porque o sofrimento dela me comove mais
que o meu! Logo a frente um homem esquelético imprensado entre a multidão e uma
barra de ferro tenta segurar duas sacolas cheias de tecido que devem ter o
triplo do seu peso e claramente seu sustento. Uns, com fones de ouvido abafam o
ruído do mundo se transportando para sabe lá que lugar de menor desconforto produzido
e vendido aos tubos pelas empresas que produzem e vendem celulares, que a cada
dia tem mais funções e duram menos, e cujo a maior e mais durável função é disfarçar
a solidão de interação.
Fora do ônibus, o caos não é menor: A fileira de carros com
outros solitários apressados em fugir, mas ainda não há a fuga desse planeta,
então todos se apressam para chegar em casa e mergulhar na fuga da novela das
oito. A industria da ilusão serve aos ricos entretendo os pobres.
E chegado o reino da ilusão: da televisão, dos
antidepressivos, do consumo, mas nas engrossadas fileiras da alienação todos continuam culpando
as drogas.
Aqui, nesse tempo, nessa realidade, é preciso muita ignorância
para se fazer de feliz!
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