quarta-feira, 3 de outubro de 2012

Texticulos

I
Da etérea matéria lavrei meu sorriso enquanto plantava e colhia algo parecido com esperanças. Sucumbi o medo e cuspi na cara do tempo. Sorri para a ideia e transcendi a emoção, e eis-me-aqui, avessa ao que fui ontem, interminada diante do amanhã, mas plenamente proprietária do hoje com quem eu costuro as vestes de infinito que logo irei vestir.


II
Abriu com custo a janela perspectiva e a luz que fazia lá fora de repente irradiou mostrando tudo que ficara escondido na escuridão. Tudo estava coberto de uma grossa capa de poeira mas era possível ver que tudo tinha jeito, uma boa faxina lhe daria acesso a tudo aquilo que estava esquecido dentro, e pensou: Porque não jogar algumas coisas fora? Foi a hora que olhou pela janela e percebeu que o mundo tinha mudado no seu recolhimento, e como era imenso e cheio de coisas: flores, sorrisos e dores, mas dessa vez não temeu, antes ansiou deixar tudo pronto para aventurar-se no mundo em busca de coisas novas que pudesse preencher o espaço vazio que ficaria com tudo do que se desfaria em breve. A essa consciência arrebatadora chamou transformação.

III
Re-Começar, re-ordenar os elementos e possibilitar uma nova perspectiva que não só transforme a situação anterior como os próprios seres anteriores e argumentos anteriores. Redimensionar os objetos dando a cada um o seu exato tamanho no espaço, na história, na vida. Daí somos capazes de entender que monstros hiper-dimensionados na parede que nos imobilizavam diante do nosso próprio medo não passava da sombra de um ratinho projetada na parede.

IV
A cultura sexista patriarcal ensina os homens a quererem e as mulheres a se comportarem sexualmente como virgens desejosas mas sem audácia, esperando sempre que na linguagem feminina venha a expressão da sentença: Eu quero mas não posso! Interessante mesmo é quando nós mulheres sabemos e podemos afirmar, sem medo, dor, culpa e nada o fato crucial: Que eu posso mas não quero!

V
Em meio a ombros e assombros, sorriu de medo e quase não conseguia erguer os olhos diante do grande e intransponível muro cinza. Quem poderia salvar-lhe se não ela a si mesma? Vestiu-se intacta, ruborizou diante de sua própria ousadia, mas, sabia que ou morria tentando ou lamentando a covardia do recuo, e quem sabe, de tanto tentar desse certo? O que havia a perder com a empreitada lhe parecia infinitamente menor e menos importante, então, medindo precisamente pesos e contra-pesos ariscou-se, e, tanta beleza teve a ousadia que mesmo não houvesse sido possível já teria valido o esforço. Por Lídia Rodrigues

VI
Não sabia como fabricar alma, então, botou a cabeça no travesseiro e respirou esperando que algum acontecimento mágico ou divino restituísse o ânimo. Era como se todas os anseios de criança tivessem virado um disco arranhado na justa parte da impossibilidade. Chorou, mas não foram reais as lagrimas, nem os medos, nem a própria falta de ânimo. Tudo compunha o enredo ridículo daquela encenação que não podia parar de representar para permanecer se sentindo viva. Não sabia fabricar alma, mas sabia forjar e fingir emoções, dentro as quais a perda latejava nos olhos que transbordavam e num momento parecia até realidade.

VII
Quanto mais vivo e trabalho mais me convenço que as prostitutas que vão as ruas fazer programa são éticas, solidárias e honestas, absurdamente mais que muita gente dita de bem, ou nem tão do bem... Há por muitas relações uma farsa de sentimento interesseiro, materialista e hipócrita que engana tão somente quem precisam do engano pra sobreviver porque não consegue lidar com a vida.

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